Saudade. Um sentimento vermelho e verde, tão puramente lusitano.
Todos sentimos saudades de vez em quando: saudades dos amigos, dos familiares, dos bons momentos passados, no fundo saudades a que eu chamo de saudades profundas; ou sentimos saudades de coisas mais simples, mas que, apesar da sua simplicidade, marcaram algumas horas ou apenas alguns minutos das nossas vidas: saudades daquele gelado de Verão, daquele livro que nos emprestaram e que já foi devolvido, daquele filme antigo, daquela música que passou no rádio, daquela série ou telenovela que nos deixava colados à TV, quietos e apáticos ou até saudades daquelas calças que já não nos servem.
Seja do que for, toda a gente sente saudades de alguma coisa, e eu não sou excepção.
Hoje, por exemplo, dei por mim a sentir saudades da minha infância, do tempo em que não tinha preocupações nem responsabilidaes e em que o mundo parecia ter sido pintado com tons coloridos por pessoas alegres e educadas. Saudades do tempo em que eu não me apercebia do racismo nem de qualquer tipo de discriminação.
A seguir, senti saudades do ano passado, dos bons momentos que passei com gente que pensava serem os verdadeiros amigos e que ficariam para sempre, embora alguns (poucos) tenham mesmo ficado. Saudades das brincadeiras e dos disparates na escola e fora da escola.
Fechei os olhos e senti novamente saudades. Saudades de todos os rostos (uns mais vagos, semelhantes aos vultos escuros que se escondem nos filmes de suspense, outros mais nítidos e mais claros) com que me cruzei e que me deixaram mensagens especiais e lições de vida, mesmo que de forma indirecta.
Também senti saudades tuas ó ser oculto que, ou vives dentro de mim ou te apoderaste da minha pessoa, e me fazes sentir tão insignificante e perceber que errei, que me podia ter esforçado mais e ter feito melhor.
Senti saudades de quase tudo, saudades do mundo.
Mas acima de tudo, senti saudades de todos os bons momentos de que me lembrei e apeteceu-me revivê-los, senti-los a todos um a um, saboreá-los lentamente e ter a certeza de que ficariam para sempre.
Agora, já acordada deste sono nostálgico, acredito que a saudade não é necessariamente um sentimento mau, pois todos os bons momentos passados ajudam-me a sorrir cada vez mais e a tentar recriá-los, embora com certeza noutro espaço e com outros protagonistas, que lhes darão outro sabor. Momentos novos que um dia mais tarde, também, eles saberão a saudade.
A saudade é então um sentimento cíclico que nos dá força para continuarmos. Um sentimento vermelho e verde, tão puramente lusitano...
Desculpem este desabafo (e este texto tão longo), mas, no fundo, quem nunca sentiu o que é a saudade?
Saudades de quase tudo, saudades do mundo.
Marta Portocarrero